Game Over na violência dos games no cinema

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“Game Over” foi a mensagem criada para encerrar abruptamente os jogos de computador dos anos 80. Mas a violência se espalhou nas telas e hoje seria bom acontecer um Game Over no excesso de transposições do ambiente de quadrinhos para o cinema e a TV.

 

A frase, estampada na tela do monitor ou da TV, informando que o jogo havia se encerrado abruptamente, deixou crianças frustradas por não conseguirem continuar jogando.

Quando meus filhos e os sobrinhos ainda eram pequenos havia uma febre de coleta de informações sobre como driblar aquela famosa e fatídica frase.

Jogos de computador na década de 1980 eram por aqui retirados (pirateados) dos cartuchos e adaptados para rodarem em fita cassete ou em disquetes de 5 ¼”. E vendiam barbaridades.

Como educador, eu diria que o natural seria a criança evoluir, amadurecer e encarar tudo isso como fantasia, que precisa e deve ficar no passado, cedendo lugar para projetos de vida, profissionais e domésticos.

É notável perceber agora que o tempo fizesse esta febre do passado virar uma espécie de fanatismo no público adulto, e motivar fabricantes de hardware a se voltarem radicalmente para o design de componentes totalmente dedicados para o melhor desempenho dos jogos. E se um usuário que deseja montar ou escolher o seu computador pessoal, mas não se interessa por games, tentar ignorar o que está acontecendo na indústria pode acabar deixando de comprar um hardware de melhor desempenho, usado para outros fins.

Muitos dos jogos atuais evoluíram e não me refiro somente à parte gráfica. O que de tempos para cá me deixa espantado não é somente a violência dos enredos dos jogos, mas a fabricação de heróis em torno deles. A intromissão maciça deste tipo de herói nos seriados e filmes para cinema e TV, acompanhando os jogos de computador, vem seguidamente banalizando nas telas a violência e justificando os assassinatos, como se estes últimos acontecessem de forma justa.

Quando Lawrence Kasdan filmou “Silverado” o ator Kevin Kline observou que morria um bocado de gente no filme. Mas, quando eu assisti tempos atrás “John Wick”, convenientemente traduzido como “De Volta ao Jogo”, eu fiquei pálido com a violência e o número de pessoas sendo assassinadas na tela, e tudo isso porque o “herói” teve o seu carro roubado e o cachorro morto por um gangster!

Em “John Wick: Capítulo 2”, a coisa ainda fica pior, quando então o personagem principal sai do seu país para matar a irmã do seu cobrador de dívida (“marker”, como eles dizem, em referência à dívida contraída em jogo de azar). Aí o número de mortos aumenta ou triplica, se quiserem.

O ator Keanu Reeves, que teve fama na luta marcial em The Matrix, consegue matar adversários como se estivesse dentro de um jogo de computador. Há uma coreografia macabra que combina artes marciais com tiroteio, às vezes com armas pesadas. Tudo isso por causa de um carro roubado e um cachorro?

Existe uma obsessão, beirando a loucura, de cineastas que insistem em criarem super heróis, cuja justiça seria matar pessoas que supostamente não prestam. A disputa entre bons e maus é histórica no cinema, mas daí a banalizar o assassinato de alguém ou, como no caso, de um grupo de pessoas indistintamente, a diferença passa a ser abismal.

Se dentro da violência urbana se pode ver isso nos noticiários locais, porque iríamos nós querer ver na mídia, cinema ou TV, este tipo de violência? A única explicação que eu encontro é: catarse coletiva! Do tipo que não resolve nada.

E, depois de ver que este tipo de produção não para mais, fica comigo a pergunta no ar: “até quando vai isso?”.

Fora o aspecto onírico de um jogo, não é fisicamente factível um personagem de um filme ou seriado sair atirando a esmo, acertar todo mundo, e jamais ser atingido de volta. A chamada suspensão da descrença não cabe aqui. Ela na realidade foi feita para filmes de animação, algumas vezes adaptada para filmes com atores, e nunca, que eu tenha observado, usada sem algum critério razoável durante a elaboração de um roteiro.

Se o cinema não vai mudar, eu estaria no grupo daqueles que não conseguem mais suportar violência radical gratuita, e começando a pular fora da plateia que ainda tem forças para aturar filmes ou seriados com este tipo de prerrogativa.

Por outro lado, a censura nunca deve ser exercida em qualquer obra literária ou cinematográfica, cabendo aos pais alertarem seus filhos sobre a liberdade de escolha e o uso do bom senso no enfrentamento do dia-a-dia.

Na vida real ninguém está imune de sofrer violência, e não falo somente da coisa física, porque a violência é ampliada pela mentira dos homens públicos, que dizem defender os interesses de terceiros, quando na verdade estão defendendo os seus ou de grupos de poder na sociedade.

A solução da violência urbana é complexa e dependente dos estadistas, motivo pelo qual nós estamos indo ladeira abaixo nas últimas décadas, tanto nas cidades como no país como um todo. Eu sou um que não gostaria de pensar em viver em uma sociedade na qual coisas como paz e harmonia se tornaram sinônimos de objetivos utópicos.

 

Game Over na violência dos games transportada para o cinema

Grandes cineastas do passado mostraram a violência como forma de criticá-la e não para apresenta-la como solução de problemas. E essa talvez seja a principal falha quando um super herói de qualquer tipo é apresentado hoje nas telas.

Em sã consciência, não poderia ser admissível matar um monte de gente para resolver a falta de segurança em um determinado país ou cidade, a não ser em legítima defesa. Muitos dos antigos gibis em quadrinhos tinham esta característica. Houve uma transposição literal para o cinema quando o diretor Tim Burton fez Batman. E depois disso, a violência não parou mais. Por mim, seria “Game Over” para o cinema, mas quem sou eu para sugerir posturas de comportamento ao público que adora ver isso nas telas?  Outrolado_

 

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Leia também:

 

O super heroísmo que atrapalha o cinema americano

 

William Peter Blatty (1928-2017)

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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