Midway (2019)… Sem Sensurround!

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Ao assistir Midway, de 2019, é inevitável traçar um paralelo com o mesmo filme de 1976, em Sensurround, recurso que não durou muito tempo nos cinemas.

 

Eu acabei assistindo displicentemente a nova versão de 2019 do enredo do filme “Midway”, de 1976. A versão em streaming do novo filme não incluiu a trilha em Dolby Atmos, mas eu deixei isso de lado, porque eu queria saber se havia algo a ser acrescentado.

Na minha coleção de filmes de guerra eu consegui ter em casa uma lista bastante eloquente de bons filmes, mas nunca deixei de verificar a verossimilhança do histórico apresentado e em que contexto ele se encaixava!

Isto porque, em sua grande parte, o cinema norte-americano (entenda-se Hollywood) criou ao longo dos anos pós-segunda guerra mundial obras generosamente fantasiosas, a maioria das quais com um cabotinismo ufanista da suposta qualidade dos soldados daquele país. Raros foram os filmes dessa época em que a exaltação do heroísmo cedeu lugar à realidade do que de fato aconteceu nos palcos de batalha na Europa e no Pacífico, onde milhares de soldados americanos perderam as suas vidas.

Sensurround como formato de áudio

A Universal Pictures saiu com essa “nova” ideia de aumentar a ambiência dos filmes através de um sistema de efeitos sonoros, que levou o nome de Sensurround. O nome está conceitualmente errado, porque sons de baixa frequência não tem direcionalidade, tanto assim que os sonofletores construídos pelo fabricante Cerwin-Vega para este fim podiam ser instalados em qualquer lugar do auditório dos cinemas.

O formato foi lançado no filme “Terremoto”, em 1974. Eu fui assisti-lo no cinema Roxy, quando o mesmo havia desmontado a enorme tela de Cinerama 70 mm, e assim a cópia apresentada era mesmo 35 mm Panavision, com trilha monaural. O Sensurround foi desenhado para inserir dois tons de controle de baixa frequência nas trilhas óticas e magnética. Um módulo controlador gerava o ruído de baixa frequência que depois seria amplificado separadamente e direcionado à caixa acústica do sistema.

Antes de entrar na sala era possível ouvir as paredes do cinema tremerem. Houve relatos na imprensa de que alguns cinemas na América tiveram problemas estruturais nas paredes, devido à ressonância provocada pelos subwoofers instalados. A Cerwin-Vega usou woofers de 18 polegadas, modelo 189 E, montados em cornetas de alta dispersão. Quando eu entrei na sala do Roxy foi possível ver a enorme caixa acústica instalada no chão da parte traseira do cinema, onde algumas poltronas tinham sido retiradas.

O filme Terremoto, apesar de efeitos especiais patéticos e de mostrar no roteiro um dramalhão misturado com comédia, foi um enorme sucesso, por conta do estremecimento das paredes do cinema.

O problema é que nos filmes subsequentes o efeito sonoplástico já não era o mesmo. Os filmes propriamente ditos muito fracos ou medianos. Provavelmente, devido a isso, o novo formato desapareceu em curto espaço de tempo, e nunca mais foi usado. Pode-se hoje, afirmar com alguma segurança, que o canal de efeitos sonoplásticos com reforço de graves, o chamado LFE ou .1 (Low Frequency Effects) tem o mesmo objetivo. Encarado assim, o Sensurround foi o pai deste tipo de efeito, e isso já um mérito da concepção inicial do formato.

Midway de 1976 e o de 2019

“Midway” foi um daqueles vários filmes que receberam uma trilha Sensurround e que não teve impacto nenhum nesta direção.

Quem assistiu Midway nos cinemas em 1976 (nesta época o home video ainda era escasso), o que se viu foi o mesmo discurso cabotino dos filmes anteriores. E novamente se percebeu que o motivo maior da audiência foi o da inclusão do formato Sensurround.

Historicamente, Midway foi uma batalha um tanto ou quanto estranha. Até hoje historiadores creditam como pura sorte a destruição das naves japonesas pelos aviões com bombas e torpedos que patrulhavam a área. A batalha virou o rumo da guerra no Pacífico momentaneamente para o lado americano, mas os japoneses lutaram até o fim com impiedosa barbaridade.

A face do super heroísmo, mito criado no lado americano, atrapalha até hoje uma versão correta dos fatos. Percebe-se no Midway de 2019 um desleixo aparentemente proposital da apresentação das forças japonesas induz o espectador que não conhece bem a história da segunda guerra a achar que a marinha nipônica era mera coadjuvante, em uma guerra previamente ganha pelo adversário.

Esse conceito já tinha sido observado no filme “Tora! Tora! Tora!”, lançado em 1970, e que é bem menos tendencioso que o atual. Se alguém prestar atenção vai reparar que o filme de 1970 deixou as suas raízes em “Pearl Harbor”, de 2001, e em Midway de 2019.

 

 

Mas o Midway de 2019 ainda pega emprestado ganchos no roteiro do filme de 2001, uma repetição quase inútil, a não ser pelo aspecto da repetida ênfase no heroísmo e na capacidade de superação dos soldados americanos.

 

 

Assistindo o novo filme, o pior ainda está por vir: os personagens são planos, sem carisma, ou até inconvincentes em alguns momentos.

Às vezes eu me flagro pensando se esta retórica de mocinhos contra bandidos ainda cola nos dias de hoje, e se cola só pode ser devido à influência da mídia que tem na sua agenda contornos políticos e/ou financeiros.

Os altos lucros da indústria de “comic books” e seus agentes midiáticos estão aí que não me deixam dúvidas a este respeito. Não é difícil perceber que, com o lucro garantido, todo mundo quer tirar uma casquinha com o sorvete dentro!

Idem para os chamados “video games”, veículos instrumentadores de violência extrema exibida na tela e/ou interpretada pelo jogador, como uma espécie de catarse virtual.

Não fosse isso, o cinema bem que poderia ser uma mídia que esclarecesse pontos obscuros de um conflito que perdurou anos a fio, com uma quantidade de vítimas descomunal.

O tema Segunda Guerra Mundial ainda promete dar panos para mangas, não só pela explosão de eventos distintos, como pelas repercussões subsequentes a eles, como, por exemplo, o início da chamada Guerra Fria e a formação de alianças entre países dos dois lados.

Eu não preciso ser saudosista para afirmar que o cinema de outrora explorou bem melhor esses aspectos, podendo até se dar ao luxo de mostrar heroísmo, mas dentro da realidade do cenário de guerra.

A sociedade apologista da contra cultura da década de 1960 expurgou o militarismo e a repressão policial como ideologias formadoras de heróis, mas aparentemente as devidas lições nunca foram aprendidas, haja visto o formidável número de séries de TV e filmes que continuam o mesmo discurso distorcido de antigamente. Outrolado_

. . .

 

LFE, o canal de graves, este ainda ilustre desconhecido

A minha primeira experiência em uma sala de cinema com Dolby Atmos

 

Apreciação da versão 4K de Jurassic Park (1993)

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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0 resposta

  1. Olá Paulo, o tema dessa matéria nos remete aquele fatídico assunto dos “remakes” Infelizmente a capacidade criativa dos Diretores da atualidade está em baixa. É bem mais fácil recriar uma estória (filme) que já foi exibida. O maior exemplo disso eu citaria a refilmagem do grande clássico The Bible de 1966, dirigido pelo mestre John Huston, com Indicações ao Oscar de Melhor Trilha Sonora Original, Prêmio Globo de Ouro: Melhor Trilha Sonora Original. Aí vem um cara chamado Darren Aronofsky e dirige o remake Noah (Noé)… Aí vou te dizer que decepção (comparável a sua com Midway). Então Paulo para não me estender, para relançar um filme que não vá mudar nada “e pior” alterar características que marcaram o filme original, principalmente no campo técnico do filme como o som (tema dessa matéria); melhor qualquer Diretor não se aventurar, pois a crítica da imprensa especializada vai massacrá-lo. Bom enquanto isso vamos apreciando os poucos novos títulos que surgem. Um abraço

    1. Oi, Rogério,

      Nós estaríamos inclinados a acreditar que, com o aumento de recursos técnicos, os roteiristas poderiam dar asas à imaginação e criar filmes de bom nível, mas o que se percebe é o desperdício completo desses recursos, e a ausência de criação de fórmulas novas, que possam contemplar todos os tipos de plateia.

      Eu creio que pior ainda do que fazer um “remake”, que inclusive demonstra esta falta de criatividade, é não acrescentar nada ao que já foi feito.

      A indústria do studio system criava sucesso nos filmes arregimentando artistas de bilheteria garantida, e com isso disfarçavam bem roteiros mal escritos. Uma visão crítica revisionista, entretanto, tira esse pseudo brilho rapidamente. Em suma, Midway era fraco e continua como tal. O novo não acrescenta nada!

  2. Olá Paulo, o tema dessa matéria nos remete aquele fatídico assunto dos “remakes” Infelizmente a capacidade criativa dos Diretores da atualidade está em baixa. É bem mais fácil recriar uma estória (filme) que já foi exibida. O maior exemplo disso eu citaria a refilmagem do grande clássico The Bible de 1966, dirigido pelo mestre John Huston, com Indicações ao Oscar de Melhor Trilha Sonora Original, Prêmio Globo de Ouro: Melhor Trilha Sonora Original. Aí vem um cara chamado Darren Aronofsky e dirige o remake Noah (Noé)… Aí vou te dizer que decepção (comparável a sua com Midway). Então Paulo para não me estender, para relançar um filme que não vá mudar nada “e pior” alterar características que marcaram o filme original, principalmente no campo técnico do filme como o som (tema dessa matéria); melhor qualquer Diretor não se aventurar, pois a crítica da imprensa especializada vai massacrá-lo. Bom enquanto isso vamos apreciando os poucos novos títulos que surgem. Um abraço

    1. Oi, Rogério,

      Nós estaríamos inclinados a acreditar que, com o aumento de recursos técnicos, os roteiristas poderiam dar asas à imaginação e criar filmes de bom nível, mas o que se percebe é o desperdício completo desses recursos, e a ausência de criação de fórmulas novas, que possam contemplar todos os tipos de plateia.

      Eu creio que pior ainda do que fazer um “remake”, que inclusive demonstra esta falta de criatividade, é não acrescentar nada ao que já foi feito.

      A indústria do studio system criava sucesso nos filmes arregimentando artistas de bilheteria garantida, e com isso disfarçavam bem roteiros mal escritos. Uma visão crítica revisionista, entretanto, tira esse pseudo brilho rapidamente. Em suma, Midway era fraco e continua como tal. O novo não acrescenta nada!

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