Zé Fidelis, o inimigo da tristeza

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O comediante Zé Fidelis se auto denominava “o inimigo número 1 da tristeza”, e era mesmo. Humor que surgiu com o rádio e proliferou nas gravações da Continental, onde cantava paródias e contava anedotas.

 

 

O rádio brasileiro da minha época de menino produziu, décadas antes, uma plêiade de humoristas cuja inventividade os colocou entre os artistas mais populares daquela época.

Tal foi o caso de Gino Cortopassi, paulista radicado no Rio de Janeiro, onde inventou um personagem conhecido como “Zé Fidelis”, com sotaque português na base do deboche.

Para quem não sabe, a imigração lusitana de várias décadas trouxe ao Brasil pessoas com pouca educação (muitas vezes só o ensino básico e olhe lá), e com uma incomensurável dose de ingenuidade. Não sei até hoje por que motivo, mas esta ingenuidade acabou por criar anedotas de tudo quanto é tipo. Foram as chamadas “piadas de português”.

O grande comediante José Vasconcellos era um exímio contador deste tipo de anedota, e na maior cara de pau foi a Portugal contar algumas delas. O trecho a seguir foi gravado ao vivo no auditório da extinta TV-Rio, localizada no também extinto Casino Atlântico, em Copacabana:

 

Zé Fidelis é um caso à parte

Comediante criativo, emérito formulador de trocadilhos infames, alguns dos quais hoje talvez fossem vistos e ouvidos como “politicamente incorretos”, mas que aguçam a sua observação sobre o comportamento da sociedade.

Eu fiquei surpreso, e compartilho a seguir, a postagem no YouTube dos discos que cercaram a minha infância, todos eles em 78 rpm, cuja existência sumiu da minha casa décadas atrás.

Os discos foram gravados no estúdio da Continental, no Rio de Janeiro. Eis aqui um disco desses que eu tive em casa, onde um lado fala de uma corrida de cavalos na Gávea e do outro lado o artista canta uma paródia impagável de “Vingança”, composta por Lupicínio Rodrigues, de grande sucesso naquela época:

 

 

Um comentário sobre o tempo que até hoje eu nunca esqueci diz assim: “O tempo está bom, firme, só que parece que vai cair uma chuva dos diabos daqui a pouco…” E não é como a gente observa a previsão do tempo até hoje?

Zé Fidelis, com aquele sotaque português impoluto e mestre em inventar nomes, faz uma paródia inteligente da narração de um jogo de futebol “Vasco x Arsenal”:

 

 

Essa coisa toda de fazer humor com a forma de falar dos patrícios teve o seu auge na PRK-30, tanto por Castro Barboza quanto por Lauro Borges.

Um dos episódios mais inusitados e mais engraçados da minha vida foi ver o meu irmão contar anedotas de portugueses para o sogro, ele e a mulher vindos de uma daquelas aldeias de Trás-os Montes, em Portugal. No clube da colônia, com o mesmo nome da região, e próximo da nossa casa, nós tivemos chance de assistir aos shows das fadistas, com aquele choro de dar pena, xale preto, etc. Ao ouvir pela primeira vez a paródia de Lauro Borges, na PRK-30, foi possível identificar a fonte com muita clareza.

A gozação dos portugueses imigrantes acho que desapareceu por completo, e a maliciosidade que veio com ela também. Durante um tempo enorme Portugal era uma ditadura, que fechou suas fronteiras para evitar a contaminação cultural externa. Os imigrantes que um dia aportaram por aqui vieram à procura de esperança de prosperarem, ficarem ricos e voltar para a “santa terrinha”, mas esta volta nunca acontecia. Culturalmente, eu nunca vi os que me cercaram abrirem mão dos antigos hábitos que eles carregaram consigo para o nosso país, e talvez tenha sido este o principal motivo pelo qual as anedotas nunca paravam.

Em contrapartida, eu vi também uma preocupação neofóbica de estrangeiros em solo britânico, tipo “bloody foreigner”. Logo que eu e a minha família nos instalamos na rua onde moramos, os vizinhos nos cercaram de atenção, mas também debaixo de uma indisfarçável curiosidade. Para evitar maus entendidos, eu disse aos meus filhos que tudo aquilo era natural, e uma grande parte daquele tratamento vinha da generosidade dos vizinhos, porém somada à expectativa que nós estávamos ali de passagem, ou seja, não iríamos roubar o emprego de ninguém!

Por puro preconceito ou não, o humor antigo fazia graça com os portugueses, nossos irmãos mais próximos. A ironia disso tudo é que nativos das Américas mesmo só os índios, todos nós somos todos imigrantes ou descendentes de!  Outrolado_

 

 

. . .

 

A PRK-30 e os grandes pioneiros do humor brasileiro

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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