As mensagens do filme A Ponte Para Terabithia

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Existem filmes que nos compelem a revisitá-los de tempos em tempos. A Ponte Para Terabithia é um deles: suas mensagens são verdadeiras e duradouras o suficiente para nunca serem perdidas.

 

Muitas vezes a gente se pergunta por que certos filmes ficam na nossa memória e nos compelem a assisti-los de novo, depois de algum tempo. Quem algum dia se interessou por cinema irá saber que a base de qualquer filme reside em um roteiro bem escrito, à exceção, é claro, de cineastas que foram eles próprios, na sua imaginação, roteiristas sem script.

E a base de um bom roteiro é, frequentemente, uma boa estória, que tenha mensagens que vão além da descrição dos personagens. Estes podem ter múltiplas camadas, mas as mensagens intencionadas no roteiro são as de caráter “subjacente”, uma espécie de mensagem escrita entre as linhas, e caberá a quem assiste a perspicácia de descobri-las.

É o caso do filme de 2007, produzido pela Walden Media, e construído pelos estúdios Disney, com o título “Bridge To Terabithia” (no Brasil, “Ponte Para Terabítia”).

 

Esteticamente, o filme é uma Fantasia (sem trocadilho) e me arrisco a dizer que Walt Disney possivelmente teria orgulho de tê-lo produzido. O roteiro é baseado no livro homônimo da escritora sino-americana Katherine Paterson, especializada em obras para crianças. O seu filho, David Paterson, no qual a experiência literária da escritora se baseia, autor de peças de teatro, coescreve o roteiro junto com Jeff Stockwell. O acabamento fotográfico da produção é exemplar!

A estória é focada na adolescência, durante a fase de descoberta de múltiplos aspectos das perspectivas de vida, mas diante de um confronto entre dois jovens que vivem condições de vida diametralmente opostas: o menino vem de uma família rural pobre, os pais despreparados para ensina-lo a viver, enquanto a menina é o oposto, cosmopolita, filha de pais intelectuais e apologistas do ensino libertário e criativo.

É esta criatividade, que, em última análise, leva a menina Leslie Burke, a criar um mundo só dela, que ela decide compartilhar com Jess Aarons, ele próprio com inclinação a criar seu mundo em desenhos que ele não compartilha com ninguém.

O filme nos mostra, logo no seu início, uma série de mensagens subjacentes (as entrelinhas do roteiro), a principal delas na “Ponte” criada na imaginação de Leslie, que representa a passagem para um mundo livre, onde as pessoas determinam o que é melhor para si. Um mundo onde não existe nenhum tipo de repressão, mas no qual é preciso lutar para vencer e controlar a vida.

Esses dois jovens, que em outros ambientes, se sentem verdadeiros párias, por motivos diferentes, encontram em “Terabítia” a base necessária para suas evoluções como seres humanos.

E então por que a fantasia? Porque é através da imaginação que se cria qualquer coisa!

A informática está aí que não me deixa mentir. Cientistas sonham em descobrir aspectos ou ângulos de visão, ao estudar qualquer assunto. E neste processo acabam entrando em um “mundo”, cuja dimensão é normalmente intimidadora, mas ao mesmo tempo desafiadora de ser penetrada!

A educação dos filhos é complexa e nem sempre está ao alcance dos pais

Esta é uma daquelas áreas nas quais eu acabei me envolvendo por conta da extensão da minha profissão. E dei a sorte de ter colegas que me ensinaram muito, tendo uma visão mais clara do que é “educar”. Se alguém quer ser um bom professor, ela ou ele têm que aprender a orientar os mais jovens, e dentro do possível libertá-los de suas mazelas.

Um dos empecilhos centrais deste processo é que muitos jovens são incapazes de enxergar o futuro, de saberem o que de fato querem da vida. O estudo fundamental deveria ajuda-los a resolver este dilema, mas o sistema falha fragorosamente. Eu por acaso tive uma colega de secundário brilhante, que ouviu de mim queixas sobre a pedagogia das escolas, e ela então me diz que “pedagogia” no Brasil não existe! E eu constatei isso durante muitos anos, vendo desatinos no tratamento dos alunos por professores que não estavam nem aí para os problemas de cada um.

Esta colega, talvez inadvertidamente, criou um laço afetivo muito forte com uma das turmas, e um dia resolveu pedir à direção da escola para trazer os pais para um conversa. Ah… Em curto espaço de tempo ficou mal vista!

Em “Terabítia” os pais de Jesse não são más pessoas, mas ignorantes quanto ao mundo do filho. Somente no final, quando Leslie morre acidentalmente (desculpem por divulgar o final), é que o pai se chega ao filho para lhe dar apoio e conforto.

Os conflitos internos de cada um

Uma ex-colega da UFRJ me disse um dia que a “maturidade” é a capacidade que alguém desenvolve de achar soluções, quando precisa resolver novos problemas. Como isso ocorre normalmente até o fim da vida é muito difícil alguém ser totalmente maduro. Eu vou mais além: é preciso acreditar que soluções são possíveis, mas nem sempre elas estão à nossa frente.

O filme lida com o sentimento da perda, um dos mais agudos estados de estresse que um ser humano pode sofrer. Em sala de aula, falando sobre o assunto “estresse” eu mencionava o fato singular do ator e tenor da M-G-M Mario Lanza, de grande popularidade, que morreu prematuramente aos 38 anos de idade, por complicações cardiorrespiratórias. Seis meses depois, sua mulher Betty Lanza apareceu morta, abraçada com um retrato do marido. Tudo faz crer que ela não conseguiu suportar aquela ausência.

Jesse encontra em Leslie a “ponte” que ele precisava para entender a si próprio, seu potencial criativo, derivado da sua imaginação. Portanto, a perda de Leslie se tornou um baque difícil de ser explicado para qualquer um. Mas, no final (e desculpem novamente pela informação) ele descobre por si só que depende dele achar o caminho para Terabítia.

Não existe coisa pior para um adolescente do que o desconhecimento deste caminho. Por aí se explicam problemas existenciais crônicos, daqueles que podem levar adolescentes à autodestruição pelo uso de drogas, entre outros recursos ilusórios.

Se alguma coisa de muito bom neste sentido o cinema pode fazer, não importa se documentarista ou em estórias de ficção, é usar a arte para construir mentes sadias.

Infelizmente, nem super heróis nem a violência gratuita recorrente, assuntos que proliferam nos filmes de hoje, conseguem dar perspectivas de uma vida vivida com a liberdade de que todos nós necessitamos todo dia!  Outrolado_

. . .

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Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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0 resposta

  1. Parabéns pelo belo discurso sobre o filme.
    Assisti 2 vezes.
    Quanto ao conteúdo de nossas escolas, fico arrasada. Levo meu neto de 8 anos para a escola, e é só tristeza. Ele não consegue acompanhar. É esdrúxulo.
    Então, eu e a mãe tentamos em casa ensiná- lo.

    Dei várias idéias para a diretora, coordenadora e professoras…
    Falei sobre a importância da fantasia. Do aprendizado através de experiências e vivências…
    Algumas coisas implementaram.
    Fiquei contente.
    Sofro, sou psicóloga.
    Ter um certo nível de consciência da nossa realidade dói.

    Mas é a única arma que temos.
    Precisamos manter as pessoas conscientes.
    A adolescência é um período muito difícil. Uma minoria respeita e olhe lá.

    Não são compreendidos.
    São muitas vezes ridicularizados…
    Eu falo:
    Por que fala assim com seu filho ( sobrinho, etc…)adolescente?
    Você se lembra de quando você era adolescente?

    Na minha época, eu tinha uma mãe alcoólatra e havia perdido meu pai.
    Me apeguei a livros de poesias…
    À escola…
    Foi o meu escape!
    Um grande abraço!!

    1. Oi, Marineide,

      Obrigado pelo seu extenso e lúcido comentário.

      Entre as muitas experiências de vida que eu tive uma das mais reveladoras foi a do meu próprio afilhado, no período em que ele cursava o secundário em um colégio de elite. Como ele tinha dificuldade para assimilar o conteúdo das aulas os pedagogos do colégio sugeriram ao meu compadre que o filho dele fizesse um encefalograma. E quando ele me contou esta estória absurda eu pedi a ele para que mandasse o meu afilhado lá para a minha casa.

      A desculpa usada era que eu queria ensinar ao meu afilhado noções de informática. Em curto espaço de tempo, e note que eu sou professor e não pedagogo, foi fácil descobrir que o meu querido afilhado não tinha empatia alguma com o colégio, problema, aliás, que eu vivi também como estudante. E depois de muita conversa este meu afilhado saiu do colégio, se aprumou, formou-se em medicina como um dos primeiros alunos da turma e desde então se tornou um médico estudioso e de sucesso.

      Como é que os ditos pedagogos não conseguem enxergar o óbvio só pode ter explicação na chamada falta de cultura. A história mostra que Einstein também teve dificuldades no colégio, parecia ser uma pessoa medíocre, e, no entanto, se tornou um dos maiores gênios da humanidade.

  2. Assisti ponte para Terabithia no cinema, e de fato o filme me marcou na época, principalmente por que fui ver o filme sem saber de nada sobre a história, nem trailer tinha visto. Na época fiquei muito curioso para ver a versão antiga desse filme (um filme para tv de 1985) mas entrou na minha gaveta de”coisas para fazer” e nunca mais procurei a versão original.

  3. Paulo fantástica matéria. Tenho esse filme em Blu-ray em casa, e assisti repetidas vezes enquanto meu filho era pequeno, agora ele perdeu o interesse. Mas posso te garantir A Ponte de Terabithia é uma verdadeira viagem ao mundo da fantasia. E se hoje essas animações nos encantam, isso é uma lição que deveria ser seguida por Diretores renomados, que se desfazem deste tipo de obra cinematográfica. Vejo na animação muito mais poder de agradar e encantar. Outro filme de animação muito acima da média é Fantasma de Scrooge do diretor Robert Zemeckis. Mas esse assunto daria margem para citarmos dezenas de outras obras maravilhosas de animação. Só nos resta ficarmos antenados sobre novos lançamentos (que na verdade não podem mais ser considerados “desenhos”), mas que não há grande interesse das distribuidoras em investir grandes somas neste gênero. É muito mais fácil eles destinarem milhões para filmes do que em uma animação. Um abraço

    1. Olá, Rogério,

      Obrigado pelo elogio.

      Eu comecei a dar aula quando tinha 22 para 23 anos de idade, sem estar preparado para este tipo de trabalho, porque a minha faculdade não tinha curso para este tipo de atividade. Isso foi motivado pelo meu futuro chefe, que me disse que a universidade não contratava cientistas e sim professores, que eu tinha que aprender a dar aula.

      O meu primeiro ano foi um desastre, mas quando a gente é jovem e inexperiente sempre arranja tempo, motivação e coragem para se virar. E eu aprendi por conta própria que a interação aluno(a)-professor depende muito da maneira como a disciplina é exposta. O aluno, uma vez diante da complexidade da sua disciplina tende a não acreditar que ele(a) seja capaz de aprender. Eu desenvolvi técnicas que trabalharam as turmas no sentido contrário. O(A) aluno(a) percebe quando a gente fala com eles(as), sem esconder o jogo, tudo aquilo que ele(a) precisa para se desenvolver. Ou seja, se dá o caminho, segue quem estiver atento e consciente de seu potencial.

      Neste filme, com o qual me identifico, os pais de Leslie pintam as paredes de um ambiente com ela e Jess, substituindo o ato de pintar pelo ato de criar, mas sem que os dois se dessem conta disso, a não ser no fim. Parece uma cena incidental, mas ela é perfeita para exemplificar que tudo que se faz na vida tem um lado criador. A “didática” é simples, quando se entende as raízes deste processo.

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