A minha primeira experiência em uma sala de cinema com Dolby Atmos

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Foi preciso aguardar a minha primeira ida a um cinema com Dolby Atmos para conseguir saber se a montagem de home theater estava correta.

 

Desde a metade da década de 1990 aproximadamente eu me vi fortemente envolvido com o setup 5.1 de som Dolby Digital na minha sala de estar, cujas paredes no final mais pareciam um queijo suíço, de tantas furações eu tive que fazer para tentar otimizar a melhor disposição das caixas acústicas do sistema.

Naquela época, o som 5.1 ainda era um nobre desconhecido para quem instalava um home theater. Eu tive que baixar uma extensa documentação do site da Dolby e até me aconselhar com um técnico americano da empresa, que emprestava os seus conhecimentos para quem queria instalar o sistema sem erro.

Mas, por outro lado, o formato 5.1 não era desconhecido de quem ia aos cinemas, porque tanto DTS quanto Dolby já tinham se envolvido com o layout, que era absolutamente idêntico. Nos cinemas cariocas, o som 5.1 DTS predominava (assim como em outros países), e quando o DTS foi finalmente substituído pelo Dolby Digital nenhuma novidade em termos de reprodução foi encontrada.

Nos cinemas, as cópias em ambos os formatos DTS e Dolby seguiram aproximadamente o mesmo padrão na bitola de 35 mm.

Em 70 mm, o formato Dolby Stereo foi usado nas projeções em película com banda magnética com 6 canais, dois do quais, com efeitos sonoplásticos de sons de baixa frequência, chamado de “Boom” na figura abaixo, o precursor do LFE:

 

 

Tal como nas cópias em 35 mm, o DTS usou um “Timecode” na película de 70 mm, que enviava sinais de sincronismo para um drive de CD-ROM, este contendo a trilha sonora em 5.1 canais.

 

Do Dolby Digital pulando para o Dolby Atmos

A instalação de Dolby Atmos em home theater precedeu a instalação do sistema em salas de exibição, e para quem, como eu, instalou o som Dolby Atmos sem ter esta importante referência, a dificuldade foi bem maior do que nos tempos do primeiro setup Dolby Digital.

O leitor que acompanhou a minha coluna no Webinsider deve provavelmente se lembrar de um texto que fala sobre a instalação do Dolby Atmos, feita de forma amadora e empírica.

Basicamente, a dificuldade daquele tipo de empreitada foi tentar determinar se o sistema 3D estava funcionando como deveria. E a única forma de determinar isso teria sido ir a uma sala de exibição com Dolby Atmos. Durante anos, nós aqui no Rio de Janeiro não tínhamos nenhuma, e consequentemente sem referência neste tipo de reprodução!

Quer dizer, até agora. Nesta semana eu me lancei ao projeto de assistir um filme com som Dolby Atmos, e o achei na sala 13 do UCI da Barra da Tijuca.

Tratava-se do filme Ad Astra, meio que uma bomba em termos de roteiro, mas que me serviu finalmente como referência de reprodução.

Antes de o filme começar (depois de aturar uma propaganda interminável), o cinema exibiu o trailer da Dolby chamado de “Horizon”, que por acaso eu tenho em casa, para demonstrar o formato.

Ao entrar na sala, eu observei a instalação do sistema, que faz parte do padrão recomendado pela Dolby: caixas acústicas no teto, apontadas em ângulo para a plateia, em duas fileiras que vão desde a tela até a cabine. O espaçamento entre as caixas Atmos e as caixas Surround laterais é muito pequeno, ao contrário do layout anteriormente usado para o Dolby Digital 5.1, e eu atribuo isso à necessidade de fortalecer a distribuição do campo sonoro necessário para abranger todas as poltronas.

 

O exibidor instalou luz azul na parte traseira de todas as caixas Atmos e Surround (foto da direita), produzindo um efeito visual muito distinto a quem entra na sala.

A sala 13 do UCI é dotada de projetor digital 4K, com emissor de luz a raio laser. A tela ocupa praticamente toda a largura da sala, e tem uma relação de aspecto que cobre todos os enquadramentos possíveis. No caso, o formato 2.39:1 do filme não encheu completamente a tela, ficando duas áreas, em cima e em baixo, sem imagem. Em uma TV 16:9 seriam as tradicionais barras pretas,.

No quesito que me importava mais e que me motivou sair de casa e ir longe para ver o filme, eu me detive a tentar comparar a distribuição do som na sala do UCI com a que eu tenho instalada empiricamente na sala de casa.

Não foi exatamente uma tarefa das mais fáceis. É preciso compreender (e eu fiz isso somente ao longo do tempo de uso) que o Dolby Atmos é previsto para uma distribuição de sinais de áudio ao longo de coordenadas XYZ, chamadas de “objetos”. Com isso, é possível emular a reprodução de cada um desses “objetos” no entorno da plateia.

Na prática, isto também significa que se cria uma ambiência na parte superior do ambiente , mas não necessariamente na posição física do teto!

No cinema é mais prático instalar caixas diretamente no teto. No ambiente doméstico, esta necessidade não se aplica!

O importante é que haja um campo sonoro formado na parte superior da sala, não importa se criado com caixas Atmos (aquelas que jogam o som para o teto), ou com caixas na parte superior das paredes frontal e traseira (que eu prefiro), ou com caixas no teto, como no cinema. E mesmo nesta última instalação, apenas 4 caixas são necessárias, ao contrário do cinema, cujas caixas precisam cobrir uma área bem maior.

E o resultado?

O que eu venho procurando este tempo todo é a resposta para duas perguntas: o som que eu tenho em casa é o mesmo da sala de cinema? E se é, existe alguma diferença que me impeça de ouvir o formato Dolby Atmos como deveria ser ouvido, ao ser criado na pós-produção do filme?

As respostas são, claramente, SIM (o som é o mesmo) e NÃO (as mixagens são idênticas), respectivamente, o que não deixa de ser um alívio! A ausência de diferença na localização de sons (“objetos”) só é possível porque os decodificadores previstos para o Dolby Atmos contemplam as diferenças de montagem, tanto no cinema quando dentro de casa!

A distribuição de caixas acústicas, na minha sala, na configuração 7.1.4, com 11 canais efetivos no total, permite cobrir toda a área de audição sem qualquer interrupção ou brecha entre as caixas. Isso pode ser comprovado pelos trailers com demonstração do Dolby Atmos, e eu já tenho 15 que eu uso com frequência, que cobrem ou varrem a extensão da sala, em cima e em baixo (leito).

Na minha experiência prévia com as trilhas Dolby Atmos, eu tive alguns pontos de certeza com a confiança de não estar errado: as caixas instaladas no teto, embora ideais, são desnecessárias dentro de casa, mas somente agora eu pude confirmar esta hipótese!

Além disso, a mixagem nas trilhas com distribuição Atmos varia tremendamente, indo do quase medíocre ao tecnicamente correto. E nos filmes onde a mixagem de bom nível prevalece é possível ouvir com clareza os pontos superiores de distribuição do que se descreve como “objetos”.

Aí está o grande avanço das codificações Atmos, que é poder perceber que o som pode aparecer onde o técnico que faz a mixagem tridimensional quiser que o usuário ouça, não necessariamente “vindo do teto”, mas nos cantos superiores da sala.

Na sessão de cinema que eu assisti eu nunca percebi qualquer som “vindo do teto”. Eu bem que poderia estar até distraído, mas acho que não foi o caso. Na realidade, a construção de uma abóboda sonora, bastante semelhante àquela conseguida na minha sala doméstica, é a mixagem que prevaleceu na minha percepção do sistema dentro da sala 13 do UCI.

No diagrama a seguir, obtido de captura do clipe de demonstração do codec Auro-3D, nota-se que a intenção clara dos projetistas foi criar a abóboda de som que circunda o ouvinte, como mencionado acima. Neste codec, o único canal acima da camada superior (camada 2 no diagrama) é chamado “Voice of God”, com uma caixa acústica instalada na parte superior do teto. A instalação é opcional. Os demais canais 3D são posicionados de forma idêntica ao Dolby Atmos, com pequenas variações. Uma modificação recente do decodificador do Auro-3D tornou o seu layout mais compatível com o Dolby Atmos, portanto o que se observa em um deles tem similaridade com o outro, espacialmente falando.

 

A qualidade do som nem sempre depende do codec

Pois eu já experimentei assistir filmes com excelente trilha sonora, a partir de codecs com formato 5.1. Na época do Laserdisc, um dos filmes que acabaram por se tornar referência em qualidade de trilha sonora foi “The Arrival” (no Brasil, “A Invasão”), de 1996, originalmente codificado para Dolby Digital e SDDS (5 canais na tela e surround dividido). Em Blu-Ray (na edição Lionsgate) a trilha foi recodificada para DTS HD MA de 7.1 canais e continua mostrando efeitos sonoplásticos exemplares, fora uma notável clareza na gravação dos diálogos. O resultado na reprodução do disco é ainda melhor com a ajuda do upmixer Neural:X.

A ironia dos sistemas analógicos, em exibição

Caramba, não faz tanto tempo assim e as cadeias multiplex já enterraram simbolicamente os projetores analógicos, ou, como no caso dos cinemas UCI da Barra da Tijuca, transformados em “obras de arte”:

 

 

Quem olha tal obra displicentemente não faz ideia da contribuição desses projetores aos bons espetáculos de cinema. Foi lá no UCI mesmo que eu assisti “Fantasia 2000”, dos estúdios Disney, em película 35 mm com imagem espetacular e ótimo som Dolby Digital em 5.1 canais. Não é possível ver a marca desses projetores, mas eles aparentam ser modelos do fabricante Cinemeccanica.

Quem quiser apostar comigo e garanto que vai perder, é o fato de que a projeção em película 35 mm difere e ganha disparada do melhor projetor digital em 4K. Aliás, a digitalização do cinema, produção e exibição, vem despertando críticas e não é de hoje.

Embora a projeção digital tenha atingido níveis de imagem de boa qualidade, ela ainda não se compara em qualidade aos antigos sistemas de projeção com película, em quesitos como cor, contraste e brilho. Além disso, mesmo trepidando levemente na janela do projetor, a película exibe um certo fascínio aos olhos das plateias que a imagem digital ainda não conseguiu conquistar.

Bem, não há volta, por enquanto. Mas, bem que os cinemas poderiam nos dar uma opção de como assistir um filme do jeito que nós mais gostamos. Nos Estados Unidos e na Europa eu sei que essas opções existem, e foram usadas mais recentemente para filmes como Dunkirk e The Hateful Eight, ambos com projetores de bitola 70 mm, IMAX e Ultra Panavision, respectivamente.

Não é esforço algum fazer isso, e o nosso exibidor local não faz porque não quer. Dá pena ver projetores de película abandonados!  Outrolado_

. . .

Leia também:

 

LFE, o canal de graves, este ainda ilustre desconhecido

O alto custo dos codecs de áudio

A função do upmixing nos receivers e processadores atuais

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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0 resposta

  1. Paulo, essa matéria revela que as vezes essas novas tecnologias nem sempre correspondem as nossas expectativas de termos acesso a elas, pois os novos formatos de processamento e codecs de áudio continuam se aprimorando ano a ano. Eu mesmo tenho percebido (e já citei isso), que o cinema como nós o conhecemos está passando (e não é de agora), por um processo de mais de mutação do que transformação, tamanha as mudanças que tenho presenciado. Se você perceber, nos últimos anos está mais caro e complexo tentarmos equipar uma sala de home theater, no sentido de acompanhar as mesmas sensações de imersão (de áudio e vídeo) implementadas nessas super salas Hi-Tech de cinemas. Afinal (para alinhavar o comentário), os conteúdos das distribuidores (em mídia) estão cada vez mais raros, e os sistemas on-demand (streaming) não terão como comportar a transmissão de um pacote de áudio e vídeo em 4K (e futuramente em 8K). Eu creio que (infelizmente) essas novas tecnologias não chegarão em nossas casas. Um abração

    1. Olá, Rogério, muito obrigado pelo seu comentário.

      É bom lembrar que o Dolby Atmos virou lugar comum em Blu-Ray e em serviços como o Netflix. Ontem mesmo, eu assisti uma série da BBC com Dolby Vision e Dolby Atmos.

      Enquanto isso, a maioria dos cinemas e exibidores parece nem ter tomado conhecimento disso. e quando tomam os ingressos aparecem com preço elevado!

      E em termos de home theater o preço da aquisição se soma à dificuldade de instalação, com aquela profusão de cabos e caixas, em ambientes nem sempre adequados.

      Tenho certeza de que você lembrar o termo WAF (Wife Acceptance Factor), que foi super badalado quando os entusiastas de home theater começaram a se aventurar com Dolby Digital e DTS. Eu mesmo tenho amigos cujas esposas exercitaram forte censura na profusão de caixas acústicas na sala.

  2. Paulo, essa matéria revela que as vezes essas novas tecnologias nem sempre correspondem as nossas expectativas de termos acesso a elas, pois os novos formatos de processamento e codecs de áudio continuam se aprimorando ano a ano. Eu mesmo tenho percebido (e já citei isso), que o cinema como nós o conhecemos está passando (e não é de agora), por um processo de mais de mutação do que transformação, tamanha as mudanças que tenho presenciado. Se você perceber, nos últimos anos está mais caro e complexo tentarmos equipar uma sala de home theater, no sentido de acompanhar as mesmas sensações de imersão (de áudio e vídeo) implementadas nessas super salas Hi-Tech de cinemas. Afinal (para alinhavar o comentário), os conteúdos das distribuidores (em mídia) estão cada vez mais raros, e os sistemas on-demand (streaming) não terão como comportar a transmissão de um pacote de áudio e vídeo em 4K (e futuramente em 8K). Eu creio que (infelizmente) essas novas tecnologias não chegarão em nossas casas. Um abração

    1. Olá, Rogério, muito obrigado pelo seu comentário.

      É bom lembrar que o Dolby Atmos virou lugar comum em Blu-Ray e em serviços como o Netflix. Ontem mesmo, eu assisti uma série da BBC com Dolby Vision e Dolby Atmos.

      Enquanto isso, a maioria dos cinemas e exibidores parece nem ter tomado conhecimento disso. e quando tomam os ingressos aparecem com preço elevado!

      E em termos de home theater o preço da aquisição se soma à dificuldade de instalação, com aquela profusão de cabos e caixas, em ambientes nem sempre adequados.

      Tenho certeza de que você lembrar o termo WAF (Wife Acceptance Factor), que foi super badalado quando os entusiastas de home theater começaram a se aventurar com Dolby Digital e DTS. Eu mesmo tenho amigos cujas esposas exercitaram forte censura na profusão de caixas acústicas na sala.

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